ENEM 2019 – Democratização do acesso ao cinema no Brasil

O conceito “Cidadanias Mutiladas”, do geógrafo brasileiro Milton Santos, explicita que a democracia só é efetiva quando atinge a totalidade do corpo social. Entretanto, na contemporaneidade brasileira, observam-se desafios significativos na efetivação desse princípio, evidenciados por questões como a falta de democratização do acesso ao cinema. Essa realidade reflete tanto a inoperância estatal quanto a alienação da sociedade.

De início, vale ressaltar que a ação débil da máquina pública é um fator que dificulta a democratização do acesso ao espaço cinematográfico. Esse cenário decorre do fato de que, assim como pontuou o economista americano Murray Rothbard, uma parcela dos representantes governamentais negligencia a conservação de direitos sociais indispensáveis, como o financiamento dos ingressos para o cinema. Em decorrência dessa negligência do Poder Público, perpetuam-se as disparidades sociais – materializadas no acesso desigual ao cinema, o qual privilegia as classes que possuem condições de pagar os ingressos para as diversas sessões e exclui os cidadãos que não conseguem custear a entrada nesse espaço. Logo, é notório que a omissão do Estado contribui para a ausência da democratização da experiência cinematográfica.

Além disso, é relevante destacar que a alienação de grande parte da população também perpetua a falta de acesso democrático ao cinema. Isso acontece porque não há uma consciência coletiva voltada para a erradicação dessa problemática. Nesse contexto, conforme destaca o livro “Paradoxo da Moral”, escrito pelo filósofo Vladimir Jankélévitch, as pessoas mostram-se passivas em relação aos impasses enfrentados pelo próximo, caracterizando uma cegueira ética por parte do homem moderno. De maneira análoga, é possível identificar tal postura egocêntrica na sociedade atual, uma vez que não se mensura a importância de obras cinemáticas como Tropa de Elite e Cidade de Deus na formação cultural dos indivíduos que não têm condições de frequentar o cinema. Como consequência, mantém-se o quadro de ausência de ações sociais voltadas para a reversão desse contexto, fragilizando, assim, a isonomia presente nas relações democráticas. Desse modo, é indispensável superar essa apatia.

É evidente, portanto, a necessidade de medidas que solucionem os desafios existentes na democratização do acesso ao cinema no Brasil. Por isso, o Ministério Público – órgão responsável pela defesa dos interesses sociais – deve, por meio da fiscalização da aplicação dos poderes estatais, pressionar o Estado a investir tanto em programas que visem à isenção de cobrança dos ingressos quanto em campanhas que instruam a população acerca da importância do cinema para a cultura brasileira, a fim de facilitar e incentivar o acesso a esse espaço. Assim, o ideal do geógrafo Milton Santos será, de fato, uma realidade no país.