Mestre

A Emancipação Semântica dos Livros

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O pintor francês René Magritte explorou vorazmente a relação entre imagem e objeto. Para expor sua visão acerca do assunto, publicou o texto “Les Mots et Les Images”, no qual asseverou que não há quaisquer relações reais entre significante e significado; isto é, o símbolo usado para designar um determinado objeto é selecionado através de uma decisão coletiva e arbitrária, e tal conexão não corresponde, pois, há uma verdade absoluta. Concomitantemente, obras literárias não precisam limitar-se a uma imagem única e podem ser interpretadas inclusive de modos que divergem das intenções originais do autor.

Reinterpretar um opus é desfrutar mais deste, como defendido pelo escritor britânico Oscar Wilde em “The Critic as Artist”. Consoante o ensaio, o dever do crítico não é, somente, avaliar um livro, mas também recriá-lo, atribuindo-lhe novos sentidos, e esta ação per se é uma forma de arte. Destarte, ao afirmar que o único significado válido de uma peça é aquele concebido pelo seu respectivo autor, descarta-se a exploração de interpretação de uma composição literária e impede o público de considerar o que uma obra pode oferecer além de seu propósito primitivo. Portanto, é irrevogável que restringir a pluralidade de imagens ligadas a um texto é limitar as expressões artísticas.

Ademais, destaca-se que a literatura é, em grande parte, subjetiva, não podendo, logo, acorrentar-se a um significado singular. Obras tais quais “Hamlet” de Shakespeare — a qual é sujeita a especulações variadas a cerca de inúmeros aspectos, dentre eles o papel de sortidas personagens no assassinato do rei e a sanidade do protagonista — e “Capitu” de Machado — na qual debate-se a veracidade do suposto adultério por parte da esposa do narrador ciumento — são estruturadas com elementos ambíguos, o que permite, propositalmente ou não, o leitor a preencher as lacunas com sua visão. Deste modo, textos são constantemente adaptados ao indivíduo, de acordo com suas opiniões e experiências pessoais.

Em suma, a desconstrução do significado de um opus é essencial para a gozação da literatura. Por meio de interpretações distintas, um livro renasce com novas conotações e símbolos, permanecendo relevante ad infinitum. Dito isso, entende-se que não existe um significado absoluto a uma peça, e a recontextualização da relação entre imagem e livro deve ser incentivada a fim de evoluir a arte da escrita, da crítica, e da interpretação.

Tema: Um mundo por imagens (FUVEST 2010)

Agradeço desde já pelas críticas/sugestões/correção! :)

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1 Correção

  1. Ótimo domínio da escrita formal do Português, compreensão e desenvolvimento do Tema no estilo do texto dissertativo, mostrou uma excelente defesa do ponto de vista apresentado, além do fato de que você soube construir uma argumentação sólida do inicio ao fim. Corrigindo por competência, sua redação é digna de nota mil.

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